Djibla
é o fotógrafo mais conhecido de São Vicente, sobretudo pelo famoso mural de
publicações logo à entrada de sua loja, na rua São João, no centro do Mindelo.
Um autêntico blogue de parede, com tudo a que público tem direito, inclusive
comentários e sugestões.
As manchetes estão mais viradas para o
sensacionalismo, com notícias de acidentes e assassinatos. No entanto, há o
lado há mais cómico, com registos das situações caricatas e bizarras que vão
tendo lugar em São Vicente, em Cabo Verde e no mundo. Coisas que normalmente
nenhum dos jornais nacionais se ocupa. Os casos mais frequentes são as fotos de
animais deformados à nascença que, quase sempre, consegue em primeira mão.
Mas sempre se pode saber mais. Na
rubrica “Variedades” o leitor pode inteirar-se de informações sobre a saúde,
conselhos médicos, entre outros assuntos. Também não faltam artigos de opinião
e curiosidades. O certo é que quem passa pela montra do Djibla nunca fica
indiferente, eleita por muitos como um “lugar de passagem obrigatória”.
“Reparei que o povo, muitas vezes, não
tem acesso a certas informações. E, como eu tenho esse acesso, através de
jornais que compro ou de recortes de jornais que muitos emigrantes me trazem de
fora, coloco o que interessa na montra para que todos possam ficar a par dos
acontecimentos”, conta Djibla, orgulhoso da sua vitrina.
Quem é Djibla?
O seu nome verdadeiro é Daniel Pinto
Mascarenhas. Este “mnine de Soncente” nasceu na ilha do Maio, a 29 Fevereiro de
1940, filho de Idalina Pinto Mascarenhas, natural de São Vicente, e de António
St. Aubyn Mascarenhas, de São Nicolau. O pai era funcionário aduaneiro e a mãe
doméstica. Aos quatro anos foram viver para São Vicente e aqui tornou-se
adulto. Aqui casou, teve filhos, sendo de há muito uma figura carismática da
ilha. Djibla conta que já andou meio mundo, mas que não troca São Vicente por
nenhum outro lugar. “Às seis da manhã estou a tomar o meu banho de mar. Onde é
que posso isso fazer lá fora?” questiona.
A paixão pela fotografia
Fotógrafo profissional, neste momento
dos mais antigos de São Vicente e até mesmo de Cabo Verde, a fotografia,
conforme confessa, “é uma paixão”. Mais do que isso, “um prazer tremendo, uma
coisa que encanta qualquer pessoa. A todos os lugares onde eu ia chamavam-me
para tirar fotografias. Depois fui ‘obrigado’ a tirar fotografias de
documentos, reportagens, casamentos, festivais, funerais”.
Com 14 anos Djibla já andava a brincar
de fotógrafo com uma máquina pequenina, da qual já não se recorda como lhe foi
parar às mãos. No então único de liceu de São Vicente, no período colonial, era
ele quem fazia as reportagens dos grandes encontros, as festas e as novidades
que aparecessem. “Nessa época as fotos eram oferecidas de graça às pessoas, mas
as dificuldades obrigaram-me depois a vendê-las”, e assim, de paixão, a
fotografia tornou-se também no “ganha pão” deste hoje empresário.
Entretanto, em 1961, Djibla partiu para
Angola, a serviço militar. Durante o tempo que esteve na tropa era o fotógrafo
do seu quartel, na infantaria de Luanda. Ganhou muito dinheiro e quando
regressou decidiu montar o seu estúdio. Isto em 1967.
Uma galeria escondida
São poucos aqueles que já tiveram a
oportunidade de conhecer a cave da sua loja, o cantinho onde Djibla guarda as
recordações e os registos das mais altas personalidades e acontecimentos que
marcaram São Vicente. É o caso da visita de Marcello Caetano, Baltasar Lopes da
Silva a discursar da varanda da Câmara Municipal por altura do 25 de Abril, os
comícios que se seguiram, a independência nacional, a chegada do barco
“Independência”, os bailes que se faziam nesse tempo e mais um número
interminável de acontecimentos. Afinal, qual testemunha ocular da história,
Djibla e a sua máquina não poderiam deixar de estar presentes nesses e muitos
outros acontecimentos que se seguiram.
Precisamente por isso, mais do que um
depositário de imagens, este cabo-verdiano, que também chegou a ser deputado
nacional pelo MpD, é também um memorialista. Gosta de relembrar e contar, para
quem quiser ouvi-lo, as histórias e os nomes que existem por detrás de todos
aqueles negativos e registos. Possui vários livros de registo onde tem anotadas
todas as pessoas e acontecimentos que já passaram pela lente da sua máquina.
Felizmente, neste momento, está a
trabalhar na digitalização de todo o seu acervo de imagens, para um dia criar
um arquivo nacional ou da Cidade do Mindelo, conforme for o caso.
Questionado
se não estaria a pensar em criar um site, responde que, por não possuir muitos
conhecimentos em informática e pela falta de tempo, prefere não pensar no
assunto. “Muita gente já me fez a mesma pergunta”, acrescenta.
As modernices
Hoje, num mundo de máquinas digitais,
onde quem quiser é fotógrafo, confessa que os negócios já não são como
antigamente. “Já quase que não há impressão de fotografias. Antigamente, muita
gente vinha cá, tínhamos os rolos e ficávamos até tarde a trabalhar. Houve uma
época, por exemplo, em que muitos chineses que atracavam no Porto Grande vinham
ter comigo. Às vezes, com trinta rolos, davam-me um prazo limitado para lhes
entregar”.
Mesmo com os tempos difíceis, Djibla diz
que vai continuar a trabalhar na sua arte. Afinal, mais do que uma profissão, a
fotografia é uma paixão que nem o tempo nem o avanço tecnológico conseguiram
sufocar nele.
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